segunda-feira, 26 de abril de 2010

21/04/10 - Jantar enogastronômico com influências Thai

Aconteceu na última quarta-feira (21/04), no Bistrot du Vin, aqui em Salvador. Trata-se de uma proposta de jantares enogastronômicos mensais promovidos no restaurante (que fica no andar superior da Grand Cru), cuja temática muda a cada vez.

Neste jantar a proposta foi oferecer um menu com uma sugestão, um leve sotaque da cozinha Thai, com elementos agridoces, e picantes. A tarefa ficou por conta do chef residente, Vinícius Figueira, que com apenas 23 anos mostra claramente a que veio.

A harmonização de vinhos desta vez ficou por conta de um sommelier convidado, José Carlos Santanita, eleito melhor sommelier de Portugal no ano passado. Certamente um profissional de muito conhecimento, e sobretudo, grande perspicácia na escolha das harmonizações, além da ousadia, afinal harmonizar um menu de influência tailandesa não é fácil, e a tendência é meter os pés pelas mãos ou cair no lugar comum.

Compareci a este jantar acompanhado de minha mãe, também apreciadora de vinhos, mas não afeita aos detalhes técnicos. Prefere apenas apreciar um bom vinho - e talvez certa esteja ela - sem se deter em análises.

Ao chegar, fomos recebidos com um mix de castanhas e nozes, e um espumante básico francês, o Grandial. O espumante era até corretinho, mas por não estar na programação oficial do jantar, preferi não descrevê-lo.

O Welcome drink oficial não podia ser mais estimulante. Um bolinho de salmão empanado na farinha de arroz, com molho de pimenta e mel, e salpicado com pimenta rosa. Crocante por fora, muito macio por dentro, sequinho, saborosíssimo. A escolha do sommelier Santanita aqui foi pelo Crèmant de Bourgogne Rosé Brut Guy & Amiot.

Ótimo equilibrio, bom volume na boca, cremoso, muita fruta vermelha. Uma ponta de dulçor levíssima segurou o mel, a acidez arrefeceu a pimenta, e o caráter frutado combinou com o sabor e aroma da pimenta também. Ótima harmonização.

A entrada foi um consomé de lagosta com coco, servido com blini de tapioca crocante (na verdade, uma espécie de beiju mesmo). Muito aromático, ótimo contraste entre a textura aveludada do consomé e a crocância dos pedacinhos de coco e principalmente da tapioca. Para completar, pedaços generosos de lagosta, e um sabor levemente picante.

Aqui a harmonizção foi pensada através da textura cremosa do consomé aliada à untuosidade do Lorca Poético Viognier 2008 escolhido. Pode não ter sido a escolha mais sinérgica, mas a harmonização funcionou, e ganha pontos por fugir ao lugar comum. Ademais, como o prato não pedia tanta acidez, a falta de acidez do Viognier não atrapalhou.

O primeiro prato foi um Robalo grelhado com risotto de shitake e cebolinha, servido com curry de maracujá e pimenta. O peixe estava grelhado no ponto perfeito, e o risotto era extremamente leve. O chef Vinícius me explicou ao final do jantar que o segredo era usar o arroz tailandês ao invés de carnaroli ou arbóreo, e finalizar com leite de coco ao invés das quantidades épicas de queijo e manteiga às quais estamos acostumados. O resultado não poderia ter sido melhor!

Na parte enogastronômica, creio que este foi o momento de genialidade do jantar. Foram propostos dois vinhos, para fazer uma brincadeira e descobrir qual harmonizava melhor. O primeiro, um delicioso Riesling alemão seco, o Fritz Haag Trocken 2007, que foi o meu favorito da noite. O segundo, um Guy Amiot Bourgogne Pinot Noir 2007, um Pinot da borgonha também muito agradável e equilibrado.

O pulo do gato aqui foi o seguinte: Nenhuma das harmonizações era desagradável ao conjunto completo, deixando à escolha de quem preferisse tinto ou branco, e o grande segredo é que o Riesling bebido após um pedaço de peixe, ficava perfeito. E o Pinot Noir, por sua vez, casava irretocavelmente com o risotto de shitake. Uma experiência que eu nunca tinha pensado, essa de harmonizar cada parte de um prato com um vinho.

Como segundo prato a escolha foi um filé mignon de cordeiro com mouseline de mandioquinha e capim santo, servido com geléia de pimenta. O filé mignon estava razoável - confesso que é o corte que menos aprecio de cordeiro - embora não houvesse uniformidade no ponto dos dois pedaços que me foram servidos (um sangrando e outro bem passado). A mouseline com capim santo estava insossa. No geral, palatável, mas poderia ter passado bem sem eles.

A escolha de harmonização desta vez também não achei a melhor. Foi um Lorca Gran Poético Petit Verdot 2006. Vinho potente, encorpado, intenso, tânico, ácido, álcoolico e persistente. Enfim, um vinho superlativo, que se equilibra no excesso. A mouseline, coitada, delicada que era, saiu da jogada logo no pontapé inicial. O cordeiro, por mais suculento que fosse o pedaço mal passado, não tinha gordura suficiente para segurar a acidez e os taninos. O vinho literalmente atropelou o prato, que não conseguiu nem anotar a placa.

Mas tudo bem. Na altura do campeonato, o jantar estava em saldo totalmente positivo. Esta etapa foi uma experiência mediana, que acabou diminuída pela qualidade dos demais pratos e harmonizações.

Para fechar com chave de ouro o jantar, foi servido um cheesecake de lichia com pimenta. Sou suspeito para falar, pois amo lichia com todas as forças. E a sobremesa correspondeu às expectativas. Um cheesecake bem cremoso com delicados aromas e sabores de laranja e limão, cobertos por uma fina camada de lichia com pimenta. Dos deuses.

A combinação aqui foi o Porto Lágrima Branco Adriano Ramos Pinto, um vinho dulcíssimo, de untuosidade quase melada, ótima intensidade aromática e persistência absurdamente longa para o que estou acostumado em um vinho. Delicioso, e sua textura untuosa e aromas frutados certamente casaram muito bem com os aromas frutados e cremosidade da sobremesa.

O preço da brincadeira? Bem, barato não foi. Custou 95 reais por pessoa. Mas quer saber? Para a qualidade da comida oferecida e dos vinhos (dêem uma olhada nos preços deles) o jantar definitivamente não foi caro. Além disso, o atendimento foi impecável e a equipe de salão não deixou nada faltar. As taças sempre cheias de vinho e água, garçons atentos e solícitos e de quebra, um ambiente que favorece aquela preguiça de quem quer apenas sentar e ser bem servido.

Quer um conselho? Se você tem essa grana para gastar de vez em quando, deixe de ser pão duro, e gaste sem medo! Vale a pena demais poder se sentar em um lugar agradável à meia luz e simplesmente se permitir ser mimado com boa comida e bons vinhos. Sem ter de escolher nada, sem precisar pedir, sem ter de pensar demais. Simplesmente se deixar levar pela experiência e aproveitar.


Um comentário:

  1. Oi Alexandre,

    Belíssimo post meu amigo!!! Um jantar deste nível aqui em SP não sairia por menos de R$200,00! Aí a brincadeira fica cara né. Sorte sua poder desfrutar disto tudo por R$95,00 e, concordo com você, uma vez ou outra fazer uma estripulia destas é uma experiência e tanto!

    Parabéns pelo blog, está cada vez melhor!

    Enoabraços,
    Gustavo
    http://enoleigos.blogspot.com

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